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29 de novembro de 2005

 

É o amor...



A origem da fidelidade
autor: El hombre maíz

Era uma vez um homenzinho das cavernas chamado “lugabugajagataga” –mas, vamos chamá-lo de Silva – que viveu há muitos e muitos anos atrás, nos primeiros anos de nossa espécie. Assim como o senhor Silva, os seres humanos daquela época andavam curvados, viviam em cavernas, comiam carne crua, não utilizavam shampoo, desodorante e nem escovavam os dentes, mas eu conheço gente que é assim até hoje, logo, nada disso pode ser muito interessante. Há fatos e questões da vida primitiva muito mais atraentes que irei abordar nessas linhas, como por exemplo, a vida sexual nos primórdios.

Bem, se por um lado tendemos a acreditar que somos pioneiros na depravação de nossa espécie e que nossos avós eram mais castos que a geração atual, o mesmo não podemos dizer de nossos tatatatatatataaravós, pois, o pessoal daquela época vivia em uma espécie de orgia primitiva que não pode ser comparada nem aos carnavais do nordeste. Até porque, é bem sabido o sexo surgiu muito antes do moralismo. Na idade da pedra lascada copular era uma necessidade fisiológica, assim como beber água ou comer mamutes. Era simples demais, não tinha que dar cantada, parecer inteligente, fingir que gosta de pagode, nada. Inclusive, mais que uma necessidade, pode-se dizer que o sexo era uma forma de passatempo também, já que naquela época as alternativas de ócio eram mais escassas: era foder ou fazer pinturas rupestres, não tinha outra.

Não havia regras, não havia limites e nem sequer havia estupros – elas sempre queriam – e tampouco havia essa história de sexo frágil, as macaquinhas eram muito mais engajadas que as mulheres de hoje, de repente vinha a primatinha caminhando e sentia aquele calorzinho subindo e...VRAU! Vem cá, meu peludão! E em meio a grunhidos decidiam quem é que ia ficar por cima.

Definitivamente eram tempos mais felizes. Aqueles que imaginam que nossos antepassados levavam uma vida dura pela falta de tecnologia só podem estar de sacanagem. No meio de uma putaria daquela quem ia sentir falta de liquidificadores, lâmpadas ou máquinas de lavar? Tá certo que nos custa imaginar a vida sem as facilidades básicas de hoje, por exemplo: tente imaginar como deveria ser difícil fazer amigos antes do orkut. Mas devemos deixar essas impressões de lado, porque o certo é que aquela geração se divertia muito mais que a gente e nem tudo que muda são evoluções em nossa espécie, e é justamente para exemplificar os tropeços dados pela humanidade nos últimos milhões de anos que voltaremos a falar sobre o nosso amigo Silva, o primata peludão.

Silva era da época dos “Homo apenas sapiens”, porém, era um pouco mais sapiens que outros e havia participado ativamente em projetos importantes como a descoberta do fogo e da roda –no momento não passavam de souvenirs - .Assim é que Silva trabalhava como fazedor de fogo, que era a profissão da moda na época junto com os roladores de roda, e levava uma vidinha modesta, muito respeitado entre seus amigos e pelas suas cinco mil setecentas e sessenta e três fêmeas, que era um número um pouco acima da média de parceiras de um primata, mas, nem por isso devemos dar algum crédito à aparência física do senhor Silva, já que naquela época isso não contava muito, visto que as pessoas eram muito parecidas umas com as outras, invariavelmente semelhantes ao Sadam Hussein quando foi preso.

Assim que a vida dos nossos antepassados era muito simples: uma fogueirinha aqui, uma trepadinha ali, uma dormidinha, levar o tiranossauro pra passear, outra trepadinha, um deseinho nas paredes da caverna, outra trepada mais e por aí vai.. Logo, se analisamos desse modo nos custa entender porque a sociedade daquela época havia aceitado mudar esse vidão que Deus lhes havia dado só para subir uns simples degraus na escala evolutiva. Alguns podem acreditar que foi por orgulho, que não viam a hora de adicionar um sapiens mais no nome da espécie, mas essa justificativa é errônea. O que realmente fez com que toda essa mamata desmoronarasse, formando assim as estruturas da atual sociedade, foi um terrível mal-entendido ocorrido no princípio de nossa odisséia; mal-entendido esse que tem como principal protagonista o Sr. Silva, o primata peludão, e sua amada “Gagtaripuga” – mas, vamos chamá-la de Maristela – uma de suas cinco mil setecentas e sessenta e três fêmeas.

Já foi dito que nosso protagonista era um pouco mais evoluído que seus contemporâneos, mais precisamente, pertencia à espécie que mais tarde se denominaria Homo agora sim sapiens sapiens, o que não significa apenas que possuia conhecimentos mais amplos sobre como usar os polegares ou fabricar melhores tacapes; significa, isso sim, que o Sr. Silva está se afastando cada vez mais de sua porção macaco para tornar-se cada dia mais humano, podemos notar nele um comportamento cada vez mais parecido ao homem moderno, uma vez que, nosso protagonista já é capaz de rir, chorar, raciocinar, contar piadas, sentir empatia, falar mentiras, jogar na raspadinha e tudo o mais que possa diferenciar o homem dos animais.

Pois bem, justamente por essa condição privilegiada de ser um macaco racional, é que nosso primata modelo não se encontra nesse momento junto a seus amigos brincando de cabecear pedras. O Sr. Silva neste instante está empenhado na busca de respostas para uma profunda inquietação que atingia a todos seus contemporâneos. A questão era a procura de uma explicação para um mal que padeciam todos os habitantes de seu vilarejo, a esse mal haviam dado o nome de “gatrefetipopipopu” , que pode ser traduzido com “síndrome do vazio no peito que nos faz sentir oco por dentro” – mais tarde mudaram o nome para “amor”.- Ninguém sabia as causas de tal doença, porém, nosso filósofo troglodita já havia elaborado algumas hipóteses.

Por exemplo, ao contrário de seus contemporâneos, já era evoluido o bastante para dar-se conta de que apesar de ser muito bacana isso de fornicar a torto e a direito e viver em meio a um bacanal “daqueles”, um mundo de sonhos onde as mulheres não sentiam dor de cabeça, havia parceiras que lhe proporcionavam um prazer incomparável às outras, porém, como naqueles tempos estava de moda ser nômade e ainda não haviam pensado em numerar as cavernas, inventar o CEP ou trocar telefones, era freqüente o fato de um casal nunca mais voltar a se encontrar depois do primeiro encontro, causando assim uma epidemia da tal síndrome e gerando o que mais tarde seria conhecido como amor platônico. Mas, o Sr. Silva é o único preocupado em descobrir suas causas, pois, naquela época grande parte da população buscava acabar com esse mal através de uma dose extra de sexo selvagem ou alimentado-se de ervas alucinógenas, o que não chegava a curar, mas, ao menos era divertido.

E chegou então o dia em que nosso querido peludo estava entretido em seus afazeres de macaco evoluido quando deparou-se com aquela que ele mesmo definiria mais tarde como a mais bela pitchuquinha de toda a Pangea. Era Maristela, uma linda morena de longos cabelos negros na cabeça e nas axilas. A atração foi recíproca, pois, Maristela ao ver aquele troglodita de mandíbulas enormes, ombros curvados, coberto de pelos, espumando pela boca e correndo atrás dela de pau duro não pensou duas vezes em se entregar ao amor sem limites dizendo: “ – Vem cá, meu ursão.” – Ela realmente lhe havia confundido com um urso no princípio – E foi uma longa tarde de amor, que durou três deliciosos minutos. Ao terminar, estavam exaustos esparramados pela grama trocando carícias e comendo insetos romanticamente. Permaneceram ali até amanhecer, um juntinho do outro, parecia que não queriam separar-se jamais.

Durante a noite, enquanto o Sr. Silva a vigiava dormir apaixonado, percebeu que voltava a sentir os primeiros sinais da tenebrosa síndrome que tanto comentavam e por isso não conseguiu pregar os olhos toda a noite, pois, já conhecia os temíveis sintomas do amor. Ele não sabia, mas Maristela também estava desperta pelo mesmo motivo, ambos sentiam a iminência de um mal que eles não conheciam a origem, a causa e nem como evitá-lo. Ao amanhecer, o medo era visível em seus olhos, se recusavam a sair de perto um do outro, mas não sabiam explicar por quê temiam separar-se, porém, sentiam que jamais suportariam perder-se vista. Por isso foi que resolveram se agarrar pelas mãos e caminhar sempre unidos para que nenhum incidente lhes afastasse, e assim voltaram ao povoado naquela manhã.

Aquele era um dia movimentado naquele vilarejo primitivo, estavam sendo realizados importantes eventos, por isso as ruas estavam cheias. Havia uma exposição de pinturas rupestres de um influente artista da época, havia também exibição de fogueiras, domadores de tigres-dente-de-sabre, brontossauros adestrados, uma festa muito bonita.

Nosso casal de primatas continuava caminhando de mãos dadas pela multidão porque no meio daquele tumulto havia um enorme risco de se desencontrar, porém, uma pequena confusão generalizada em frente a uma loja de tacapes havia chamado a atenção do Sr. Silva e fez com que se descuidasse e soltasse a mão de Maristela por uns instantes. A confusão derivava de uma queixa dos consumidores da loja que não compreendiam uma tal de “promoção” que havia inventado o vendedor de tacapes.

Segundo a tal da promoção o cliente levava três porretes pelo preço de dois, mas, não dizia quanto custaria se quisesse levar apenas dois, o vendedor tentava explicar que dois porretes valiam o preço de dois porretes e dava direito a levar um terceiro, mas não conseguia encaixar essa lógica na cabeça de seus compradores, assim que, enquanto o Sr. Silva tentava fazer uso de seu carisma para apaziguar os ânimos e dar uma mãozinha ao pobre vendedor, Maristela se encontrava sob miradas fogosas de um brutamonte da região – não há sentido pejorativo, era realmente um brutamonte – e foi então que o tal troglodita a agarrou e pela primeira vez na vida Maristela sentiu repulsa por um homem e se pôs a gritar por ajuda do Sr. Silva que pela primeira vez sentia ciume de uma de suas cinco mil setecentas e sessenta e três fêmeas, e chegou a tempo de evitar o primeiro estupro da pré-história e fugiu sob os olhares incrédulos de toda a aldeia que nunca havia visto ninguém negar umazinha.

Silva e Maristela refugiaram-se em uma caverna - Só havia cavernas pra se refugiar – e a partir daquela momento não tinham já a menor dúvida de que se necessitavam, e por isso haviam decidido compartir o mesmo lar, para passarem todos os dias juntos um do outro. E aquele minúsculo lar era imensamente mais interessante que o enorme mundo lá fora, que se encontrava sem muitos atrativos nesse momento. Assim viveram Silva e Maristela monogamicamente por anos, não por medo a um divórcio caríssimo ou toda a dor de cabeça que traria a papelada, e sim porque eram conscientes de que se queriam e se bastavam. Às vezes ao caminhar pelo bosque o Sr. Silva encontrava flores tão bonitas que faziam com que recordasse sua amada, por isso trazia algumas para casa e lhe dava de presente, para que ela soubesse a que poderia ser comparada sua beleza. Maristela adorava quando recebia presentes e retribuia preparando a carne de mamute cru preferida de Silva.

A história do casal fiel se espalhou por todo o povoado. Toda mulher queria um homem que lhe trouxesse flores e todo homem queria uma mulher que preparasse sua comida. Além do mais, a sociedade da época achava injusto que Silva tivesse uma mulher só pra ele, enquanto as outras todo mundo metia a mão. E foi então quando todos passaram a buscar seus respectivos pares para ter o direito de controlar a vida de alguém. Criaram-se leis, cerimônias e normas de comportamento. Assim como nosso casal modelo, surgiram vários outros casais que passaram a dividir o mesmo teto e compartir todas suas intimidades, com a única diferença de que tais casais o faziam por imposição moral, e, não por amor. Ao ato de contrair relações sexuais com terceiros deu-se o nome de “traição”, mas não se referia a uma traição de sentimentos, pois, esse nunca havia existido, e sim de uma traição do acordo de não finfar com mais ninguém.

Obviamente, nem tudo funcionava nessa nova ordem mundial, as tais traições, por exemplo, eram freqüentes, para evitar esse tipo de incidente buscaram várias saidas, desde o ciúme doentio, castigos físicos, chantagem, humilhações, quase tudo, só não tentaram amar. Outro problema enfrentavam aqueles que discordavam da monogamia, pois cada dia era mais gente aderindo ao novo costume que se tornava cada vez mais difícil se divertir como antigamente.

Teve também o drama daqueles que escolheram mal seus fiéis parceiros e perderam grande parte da vida ao lado da pessoa errada. Não podemos esquecer obviamente da triste história daqueles que acreditaram demais nas novas regras impostas pela sociedade e esperaram a vida inteira em solidão, vendo a felicidade passar por seus narizes, à espera do único e verdadeiro amor que nunca apareceu. Mas, havia também aqueles que conseguiram manter a fidelidade até o final de suas vidas, talvez muito mais por respeito do que por amor a seu cônjuge, houve também os que se agarravam a alguém por medo de uma tal doença nova chamada “gabalucaracatuga” – mais tarde mudaram o nome para “solidão” - que havia surgido coincidentemente após a triunfo da monogamia imposta.

Enquanto isso, Silva e Maristela observavam todas essas mudanças ocorridas no mundo, através do fundo de suas cavernas. Tentaram ajudar, abrir os olhos de todos argumentando que essas coisas não eram assim, que não podiam ser impostas, que deveriam acontecer de forma natural, involuntária, sem acordos e sem desconfianças, mas, já era tarde, ninguém lhes escutou, estavam muito infelizes para escutar bons conselhos, e como por uma fatalidade do destino, uma pancada nos testículos de Silva muitos anos atrás lhe havia impedido de ter filhos por toda sua vida, nem sequer puderam passar às suas crias os ideais do amor propriamente dito, e tudo que sobrou foram declarações de amor primitivas desenhadas nas paredes de uma caverna perdida.

***
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Comments:
UHauhuhau texto incrível, humor gritante e criatividade evidente.
Meus parabéns!
 
Para Bete:
Opa! Mais uma fã! Fala que tá apaixonada por mim, fala, eu preciso ouvir isso! aheheheheheh
Legal, espero que visite mais vezes El Hombre Maíz
beijos
 
Clap, clap, clap.
Parabéns. Muito bom.
 
Aplausos de pé pela cimicidade, irreverência, passagens poéticas(sim...elas existem! aqui neste conto!)e principalmente pela absurda criatividade!
Parabéns, Thiago!
Valeu, mais uma vez!
Sua mãe está corretíssima em escolher este seu melhor texto!
 
Tenho q te dar meus parabens
vc soube descrever o relacionamento à dois
de uma maneira muito inteligente
dinâmica, adorei vc citou a pré história mas não se esqueceu dos
verdadeiros valores
parabens!!!!!!!!
Renata Shania
 
Cara de milho, se eu morasse na Espanha visitaria milharal por milharal a sua procura...você sabe das coisas meu rapaz...só não falo que tô apaixonada por vc porque não sou muito adepta a relacionamentos virtuais...rs
 
sen-sa-cio-nal!

clap,clap,clap,clap,clap,clap!
 
Ginger:

Concordo, relacionamentos virtuais são sonolentos. O negócio é sentir na carne, como faziam Silva E Maristela.

Ju:

Valeu!
 
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